A gente passa a vida fazendo o "Jogo do Contente".
Pensa bem - a gente diz pra gente mesma - tem gente sofrendo mais que eu, tem gente que não tem o que eu tenho, olha pro lado, vê como tem pessoas em pior situação, eu tenho duas pernas, dois braços, dois olhos, tem gente que não tem...
Bem, desde pequenos ouvimos isto e vamos introjetando. Quando estamos deprimidos ou nos sentindo como se carregássemos o peso do mundo, vem sempre alguém com a melhor das intenções dizer uma destas frases. Ou então, nós mesmos, como consolo pra tanta desgraceira que, por vezes, cai sobre a gente, falamos interiormente, como se nos anestesiássemos: - Pára de reclamar, é só olhar pros lados pra ver que tem muito mais sofrimento por aí do que o seu!
É isso ou um tiro na cabeça...Tem gente que se acha egoísta por estar sofrendo quando há tantos problemas graves à nossa volta, tanta fome, tanta miséria. Mas acontece que cada um TEM o direito de sofrer, sim.
Acho que os sentimentos humanos existem para serem sentidos com toda a sua força. Precisamos dar vazão, deixá-los sair. Gritar, chorar, espernear. Sentir raiva, dor, prazer, alegria. A compaixão tem lugar, mas quando sofremos, só nós sabemos da nossa dor.
Subestimar nossos sentimentos, tornando-os menores, sublimando-os ou fingindo que não os sentimos, isso sim, é doentio.
Fomos feitos pra nos regozijar com pequenas coisas e chorar também por elas. Pelas grandes então, nem se fala.
Setembro chegou.
É o meu mês. O mês em que nasci e em que a Primavera me traz de volta pequenos tesouros.
Sempre acontece algo de bom para mim em Setembro, nem que seja um almoço em família no dia do meu aniversário.
Olho pela minha janela e me recordo do que vi através dela durante todo esse ano.
Pequenos grandes milagres da Vida, diariamente. Os micos leão da cara dourada, com seus filhotinhos às costas.
O gaturamo verdadeiro, com seus tons de azulão e amarelo intensos...
O filhote de porco espinho, vindo comer os restos das frutas que os micos deixaram...
Os canarinhos da terra, livres, comendo a canjiquinha que coloco para eles no muro...
O lagartão de um metro e meio que mete medo em muita gente, mas que tem mais medo de nós do que nós dele...
Vejo tudo isso da minha janela e muito mais, durante todo o ano.
Sofri? Muito! Este ano foi um ano intenso, em que muitas vezes me senti fraquejar, em que muitas vezes pedi (sim, pedi, não sei a quem, mas pedi) que minha vida tivesse fim...e que meu sofrer terminasse...
Mas, também tive inúmeras alegrias. Fiz amigos de verdade, conheci algumas pessoas ao vivo, pude abraçá-las, sentir seu calor e dizer o quanto as amo olhando em seus olhos...Estreitei laços, lancei meu livro...
Escrevi, escrevi...chorei, chorei. Tive momentos de intensa euforia, e também de profunda depressão...Os hormônios, ah, benditos hormônios ( ou será que devo chamá-los de malditos? )...
Enfim, olhando pela minha janela, via a Vida e a cada dia que passa entendo mais do que é feita.
Da dor e da alegria, do sal e do açúcar...de nascimentos e também de perdas.
Mais um aniversário se aproxima e sei mais acerca de mim.
Acho que disso tudo, essa é a grande certeza que tenho hoje: Me aceito e me conheço.
E sei do que sou capaz.
Minha janela é minha vida. Sou grata por ter me mostrado que a natureza sou eu. E que eu sou ela.
Fosse entre lágrimas ou entre sorrisos, vi meus bichos, diariamente e, todos eles me pertencem e eu a eles.
Por esse retângulo iluminado pela claridade lá de fora, olhei e vi.